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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

CAIO E O DRAGÃO DOURADO – Parte 4


CAIO E O DRAGÃO DOURADO (Parte 4)

Logo que amanheceu, os dois se alimentaram, e partiram seguindo as pegadas do dragão.

Caio percebeu que, foi só retomarem a busca, a alegria tornou a se apagar no rosto de Camilo. Desconfiado, perguntou:

– Por que não me diz o que está acontecendo?

Camilo fingiu ignorar a pergunta, e Caio, sem parar de cavalgar, insistiu:

– O que você está escondendo? Por que não facilita o meu trabalho e diz logo tudo o que sabe sobre esse dragão? Aposto que você já o viu.

Como Camilo permanecesse calado, Caio olhou para trás para poder observar a expressão em seu rosto. Ficou surpreso ao verificar que uma névoa de ódio e tristeza encobria suas bochechinhas rosadas e contraía suas feições.

Foi só naquele momento que Caio percebeu que Camilo não era tão ingênuo quanto ele acreditara. A contração em seu rosto parecia mais um esforço para tentar segurar a lava de sentimentos tempestuosos que estava prestes a emergir de seu peito.

Não conseguindo mais suportar o olhar firme de Caio, Camilo finalmente disse magoado:

– Ajude-me a descer. Não quero mais acompanhá-lo, porque me enganei a seu respeito.

Caio, reagindo às palavras de Camilo, exclamou:

– Que história é essa?!... É você quem está prestes a explodir e não eu! Você é mesmo uma criança, ou será um daqueles serezinhos endiabrados que as pessoas dizem proteger esses dragões infames?

Camilo rebateu prontamente:

– Os duendes não são seres endiabrados! Eles têm mais coração do que você e a aquela sua princesa assassina!

Caio ia dizer algo em defesa de Cândida, mas o choro convulsivo de Camilo obrigou-o a se calar.

Sisi Marques


quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

CAIO E O DRAGÃO DOURADO - Parte 3

CAIO E O DRAGÃO DOURADO (Parte 3)


Eles já haviam cavalgado por algumas horas, quando, de repente, Caio fez um sinal para o cavalo parar. Virando o rosto para trás, disse a Camilo:

– Olhe só para o chão: pegadas... Nosso dragão esteve aqui, e não faz muito tempo. Quer mesmo continuar, ou prefere desistir?

Camilo não respondeu, e Caio desceu do cavalo para observar melhor as enormes pegadas do animal. Quando ia tornar a montar, notou certa apreensão no rosto de Camilo. Para deixá-lo mais à vontade, exclamou:

– Não me diga que nosso pequeno herói está com medo de um dragãozinho de nada! Pensei que fosse mais corajoso!...

Quando os olhos de Camilo se encheram de lágrimas, Caio arrependido de ter feito o gracejo, desculpou-se:

– Ei, foi só uma brincadeira! Não precisa chorar. Sei que é corajoso. Talvez seja por isso que eu goste tanto de você.

As palavras de Caio não foram suficientes para impedir que o rosto de Camilo se banhasse em pranto. Era um choro silencioso, sem soluços, nem lamentações.

Caio percebeu que só havia um modo de alegrá-lo. Começou a cantar:

“Você é criança,
A esperança
De um mundo melhor...

Eu sou um adulto,
Ainda puro;
Um dos poucos que há...

Nós dois unidos
Espalharemos
Confetes de Luz
E Paz...”

Caio não se enganara; a canção fez Camilo enxugar as lágrimas, e voltar a sorrir. Caio também sorriu; a simples presença do garoto tinha o poder de deixar seu coração mais leve, apesar do terrível crime que ele estava prestes a cometer.

Os dois não seguiram viagem. Caio fez uma fogueira para esquentar um pouco da comida que havia levado, e para aquecê-los durante a noite. Receando que o dragão aparecesse e os surpreendesse enquanto dormiam, ele passou a noite toda atento; embora os seus olhos se fechassem de vez em quando, os seus ouvidos continuavam bem abertos.

Camilo, por sua vez, não parecia guardar em seu coração o mesmo receio, porque dormiu feito uma pedra a noite inteira.

Continua...

Sisi Marques

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

CAIO E O DRAGÃO DOURADO - Parte 2

CAIO E O DRAGÃO DOURADO (Parte 2)



Uma semana depois, Caio partiu em busca do dragão, ou melhor, Caio partiu em busca da cabeça do dragão... Esse era um pensamento deprimente... Caio sabia que estava prestes a tornar-se um assassino.

Caio não levou consigo nenhum de seus instrumentos musicais, nem tampouco sentiu vontade de cantar durante a viagem. Seguia cabisbaixo em seu cavalo negro.

Negro, o seu cavalo era negro... Mas, ainda mais negra que seu cavalo, ficaria sua alma depois que ele tivesse decepado a cabeça do infeliz dragão.

Caio franziu as sobrancelhas cerradas e mordeu o lábio inferior. Decepar!... Como ele odiava esse verbo!

O caminho pedregoso, que o levava até a gruta onde se escondia o dragão, parecia interminável. À medida que Caio avançava, o seu ânimo se extinguia.

Quando se encontrava já a uma pequena distância de sua vítima, Caio viu-se obrigado a parar para ajudar um garoto que estava sendo abordado por um grupo de malfeitores.

Felizmente, Caio sabia lutar e manejar sua espada tão bem quanto conseguia casar as notas em suas canções de amor, e não demorou muito para que os seus adversários percebessem isso e se pusessem a correr.

O garotinho, ainda assustado, agradeceu:

– Obrigado. Se não fosse por você, a esta altura eu estaria morto.

Caio, guardando sua espada, disse:

– Não creio que tivessem a intenção de matá-lo. O que faz aqui? Não parece estar perdido.

– E não estou.

Caio insistiu:

– Não respondeu minha pergunta. O que faz neste trecho da floresta? Não ouviu falar sobre o dragão?

O menino exclamou surpreso:

– Dragão?! Não há nenhum dragão por aqui; se houvesse, eu já o teria visto. Você mata dragões?

Caio respondeu:

– Não, exatamente. Qual é o seu nome?

– Camilo.

– Meu nome é Caio. Agora que já nos tornamos amigos, por que não me diz onde mora para que eu possa levá-lo de volta aos seus pais?

– Não posso voltar para casa. Aqui é o meu lugar.

– Não diga tolice. Fugir não o ajudará a resolver seus problemas.

– Não estou fugindo.

Com a intenção de desviar o assunto, Camilo comentou:

– A sua voz é suave; aposto que sabe cantar. Quer que eu lhe ensine uma canção?

– Não. Vá andando, garoto. Siga o seu caminho, que eu preciso seguir o meu.

Quando Caio se preparava para partir, Camilo começou a cantar:

“Eu sou criança,
A esperança
De um mundo melhor...

Você é um adulto,
Ainda puro;
Um dos poucos que há...

Nós dois unidos
Espalharemos
Confetes de luz
E paz...”

A canção de Camilo, como uma flecha certeira, atingiu Caio sem dar-lhe tempo para se defender com seu escudo de amargura.

Camilo tornou a cantar, e Caio teve que se render... Aquela criança conseguia arrancar de seu coração os sentimentos que ele teimava em ocultar.

Aproximando-se de Camilo, Caio exclamou:

– Não sei o que fazer com você!...

Camilo, sem perder tempo, sugeriu:

– Deixe-me acompanhá-lo. Sei que está pensando em matar o dragão... Se é que ele existe!

– Não posso. Você ainda é muito criança. Por que não volta para casa? Lá estará livre da violência do mundo.

Para surpresa de Caio, Camilo perguntou:

– Se eu lhe disser que volto para casa, você promete desistir de matar o dragão? Sei que não quer matá-lo.

Caio, amargurado, fitou o rosto do garoto e respondeu:

– Tenho que matá-lo, porque é uma questão de honra. Se eu desistir, dirão que sou covarde, e perderei a oportunidade de me casar com a mulher que amo. Consegue compreender por que é tão importante para mim matar aquele dragão?

Camilo, pensativo, respondeu com outra pergunta:

– Por que você não pode se casar, se não matar o dragão?

– Eu já lhe disse: tenho que provar que sou corajoso, para poder merecer a mão da princesa Cândida.

– É ela quem dirá que você é covarde, se não matar o dragão?

– Você compreendeu.

– Se é assim, não deveria se casar com ela.

Caio sorriu antes de perguntar:

– Por que diz isso?

– Porque ela não ama você.

– Não diga bobagem! Agora, seja bonzinho e volte para casa. Não posso ficar aqui a tarde toda... Não percebe que logo estará anoitecendo?

– Pode ir embora, se quiser... Eu ficarei bem.

– E deixá-lo aqui sozinho?!... Está certo!... Pode vir, mas terá que prometer que ficará bem longe da toca do dragão.

Camilo, sorrindo, fez um ligeiro movimento afirmativo com a cabeça. Após alguns minutos, partiram os dois montados no cavalo de Caio.


Continua...


Sisi Marques



sábado, 1 de fevereiro de 2014

DRAGÃO DOURADO


CAIO E O DRAGÃO DOURADO - Parte 1

CAIO E O DRAGÃO DOURADO (Parte 1)



Existem muitas histórias sobre dragões e matadores de dragões. Na maioria das vezes, os dragões são criaturas pouco ou nada amistosas, enquanto que os seus adversários, ao vencê-los, recebem a fama de heróis.

Mas agora eu pergunto: E se o herói se recusasse a matar o dragão por não achá-lo verdadeiramente hostil?... Você ainda o chamaria de herói, ou diria que ele é covarde e só está mesmo procurando uma desculpa para não enfrentar o dragão?

Antes que você rotule a recusa do herói em matar o dragão de nobreza de caráter ou covardia, deixe-me contar-lhe uma história que ouvi quando ainda era criança.

Certa vez, um músico apaixonou-se por uma princesa. Embora o seu amor fosse correspondido, ele só poderia desposá-la quando trouxesse para o rei a cabeça do temido dragão dourado.

Entretanto, para o nosso músico apaixonado, matar, fosse lá o que fosse, representava o mais desprezível ato que um ser humano poderia cometer.

Seria o seu amor forte o bastante para ajudá-lo a empunhar a espada e sujá-la com o sangue do dragão? Ele procurava desculpar-se com a princesa, dizendo:

– Cândida, sinto muito, mas não posso matá-lo. Temos que encontrar um meio de fazer com que o seu pai compreenda isso.

A princesa retrucava impaciente:

– Já estou cansada desse seu sentimentalismo, Caio.

Depois, para provocá-lo, acrescentou:

– Ou será que é a sua covardia que o impede de satisfazer a vontade de meu pai?...

Chocado com a insinuação de sua amada, Caio respondeu:

– Não sou eu o covarde. Covardia é o seu pai querer a cabeça daquela criatura inofensiva.

Furiosa, a princesa exclamou:

– Inofensiva?! Como ousa dizer que aquele animal repugnante é inofensivo?!

– Talvez, o dragão seja repugnante; contudo, não se tem notícia de que ele tenha atacado alguém antes de ter sido provocado. Além disso, nunca feriu ninguém gravemente.

– E vamos esperar que isso aconteça, para depois matá-lo?!... Por causa desse monstro, ninguém mais passeia pela floresta. As pessoas vivem ansiosas, com receio de que ele apareça quando menos se espera. Você terá que matá-lo, ou do contrário...

Caio ficou olhando para a princesa Cândida, esperando que ela continuasse. Sem hesitação, ela acrescentou:

– Não haverá casamento, porque eu direi a meu pai que não desejo me casar com um covarde.



Continua...



Sisi Marques